Amazonas

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Um antropólogo americano do MIT foi até o Brasil, no meio da floresta amazônica, em busca de provas da existência das mulheres guerreiras conhecidas como Amazonas. O antropólogo era fascinado com a lenda das Amazonas e, apesar de saber que as mulheres guerreiras Amazonas da Amazônia brasileira eram o nome dado a uma raça de seres humanos do sexo feminino que existia em toda a parte do mundo, sendo relatada primeiramente entre os gregos. Amazonas é o nome dado a uma civilização que dominou o mundo durante eras, e que atualmente está quase extinta, existindo possivelmente na Amazônia brasileira, pois estes eram os últimos resquícios da presença desta civilização na idade moderna.

No dia 04 de maio de 1986 o antropólogo americano do MIT Dylan Moore chegou ao Brasil. No aeroporto foi recebido por seu tradutor e assistente da Unicamp o antropólogo brasileiro Ângelo de Azevedo, e juntos ali mesmo ele eles transladaram par outro avião de pequeno porte que os levou direto do aeroporto de Natal até o Pará, no meio da floresta Amazônica. Aterrissaram numa pista construída ao lado de uma aldeia indígena já acostumada com a presença do homem branco, servindo de entrada na Amazônia para muitos pesquisadores. Naquele dia os dois antropólogos ficaram hospedados na aldeia em uma de suas muitas ocas e redes de dormir.

No outro dia ainda na aurora do sol pintado o verde da floresta em um amarelo ouro quase mágico, os dois antropólogos agradeceram os indígenas pela hospedagem e partiram para dentro da mata densa e hermética, tomada por um brilho intenso da luz do sol rasgando as gotas de água do nevoeiro sobre a relva. Com suas mochilas e seus equipamentos, mapas, livros, cadernos e lápis, andaram durante horas a fio no meio da floresta rumo à região onde eles acreditavam que seria a mais provável de se flagrar os costumes das Amazonas. Eles caminharam de baixo de sol e chuva durante três dias e três noites até em fim chegarem ao local desejado. No entanto, depois de uma semana de procura cuidadosa, sol, chuva, insetos, pântanos, bichos peçonhentos e perigosos, noites de sono nada tranquilas, os antropólogos ainda não haviam encontrado sequer um vestígio da existência das Amazonas naquela região da floresta. Já ficando cansados, os mantimentos iniciais se acabando, apesar de estarem caçando e comendo alimentos encontrados na mata, eles acabam desistindo de sua empreitada original e decide retornar à aldeia onde pousou pela primeira vez para reabastecer suas forças, pesquisar e entender mais agora diretamente com os índios e não com os livros, o que eles sabiam sobre a existência das Amazonas. Na volta para a aldeia, Dylan, num acesso de asma controlado por uma bombinha que ele carregava sempre consigo, deixou o seu mapa cair sem querer no rio amazonas, no qual entrar não seria para ele uma opção, pois queria voltar para casa e, se possível, vivo e com a documentação que comprova a existência da civilização das Amazonas.

Sem o mapa em mãos, eles começaram a se guiar pelas estrelas, mas era incerto porque a mata era muito densa e fechada e impedia uma boa visualização do céu, com medo de que sua observação estivesse sendo prejudicada pelas enormes árvores da floresta, Ângelo construiu uma bússola com um pedaço de arame que, magnetizado com seu cabelo e posto sobre uma folha boiando sobre uma poça d’água, apontou a direção para onde seguir.

No meio do caminho, porém, bem no crepúsculo da noite, os antropólogos resolveram acampar para passarem a noite. Aramaram suas barracas e se deitaram dentro da barraca iluminada somente pelo lampião. Durante a noite fria, densa e melancólica regida pelo canto macabro da mãe da Lua, os antropólogos começaram a ouvir sons bem distintos de vozes femininas a cantar como se estivessem dando uma festa ou realizando alguma cerimônia religiosa. Pensando que este fosse um sinal claro de que estava indo na direção certa, de que estavam perto da aldeia de onde saíram, eles não se preocuparam, e saíram da barraca para tentar descobrir de onde exatamente vinham aqueles sons.

Ao saírem da barraca, olharam fixamente no escuro toda a floresta em volta e só ouviram aqueles sons como se fossem ecos na floresta, não conseguindo identificar de onde vinham. Todavia, de repente Dylan viu ao longe no meio da floresta um brilho de fogo e, tão logo, percebeu que ali estava a tribo que habitava a aldeia de onde eles haviam saído, e que os havia acolhido tão bem. Felizes, eles se cumprimentaram e se abraçaram comemorando o achado da aldeia. Tão alegres e vendo que as luzes estavam apenas há alguns quilômetros a sua frente, ambos juntaram suas coisas e saíram no meio da noite sombria da floresta rumo à aldeia de onde eles haviam saído inicialmente.

No entanto, ao se aproximarem mais e mais das luzes e dos sons, com o olhar enviesado para a mata, ambos se deram conta de que aquela não era a tribo de onde eles haviam saído, mas sim a horda das Amazonas, pois ao redor do fogo estavam mulheres alvas e altas, com um cabelo negro belo e cumprido, trançado de forma impecável da cabeça até as pernas. Eram muito altas e muito fortes, andavam nuas em pelo vestidas somente com seus arcos e flechas penduradas em seus corpos a tamparem somente uma pequena parte de seus seios e vagina; e elas dançavam e cantavam em volta do fogo no meio da floresta amazônica, como se comemorassem alguma festa religiosa cheia de êxtase e deslumbramento provocado pelo fogo.

Quando os antropólogos se deram conta de que eles, por acaso, haviam em fim encontrado a civilização das Amazonas, as mulheres guerreiras, eles quase desmaiaram de tanta alegria, por constatarem a veracidade da lenda; mas, ao mesmo tempo, receosos com a fama das Amazonas de serem boas guerreiras, se mantiveram a distância a noite toda enquanto observavam a cerimônia religiosa das Amazonas com seus binóculos, enquanto anotavam no escuro iluminado somente por uma vela camuflada com folhas e uma armação improvisada de galhos de árvore, tuto o que estavam registrando com seus sentidos naquele instante, e descrevendo todo o cerimonial religioso das Amazonas. Eles sabiam que haviam feito a descoberta do milênio e que, caso conseguissem voltar para casa com todo o material anotado em seus cadernos, isso lhes renderia prestígio, reconhecimento, glória e fama no mundo acadêmico, por isso tomaram muito cuidado para não serem vistos durante a madrugada pelas Amazonas.

Todavia, no meio da madrugada, enquanto espiavam e anotavam o comportamento das Amazonas, ambos ouviram um barulho estranho na mata vindo da escuridão sombria da floresta; assustados, pararam tudo o que estavam fazendo e ficaram a observar emudecidos a escuridão da floresta e, depois de alguns segundos de um total silêncio, viram duas Amazonas saírem do meio da mata densa e escura e saltarem sobre seus corpos, fazendo-os desmaiarem no mesmo instante.

Quando acordaram, os antropólogos estavam  nus e amarrados com cipó a um grande tronco no meio da aldeia das Amazonas. Assustados e com medo, viram centenas de Amazonas dançarem e cantarem em volta de seu corpos nus e, reparando em seus olhares famintos, viram todas aquelas mulheres seduzirem-no, apesar do medo, deixando-o excitado, enquanto elas se aproveitavam da ocasião e mergulharam numa orgia completa entre elas e eles até eles próprios não aguentarem mais.

Quando chegaram ao esgotamento total de seus corpos, os antropólogos, desacordados, foram retirados do tronco e colocados sobre um enorme caldeirão com água fervendo sobre uma grande fogueira. Depois de uma madrugada inteira cozinhando os corpos dos homens, em fim todas se serviram de uma grande sopa de carne humana.

Nove meses depois, centenas de Amazonas começaram a gerar seus filhos com os dois antropólogos. E de todos os bebês que nasceram, somente as mulheres eram mantidas vivas e cuidadas na horda, enquanto que todos os bebês homens eram imediatamente assassinados por suas próprias mães que, simplesmente quebravam o pescoço da criança ainda ligada ao cordão umbilical e ali mesmo os enterrava. Desta forma as guerreiras Amazonas sempre se mantinham escondidas e, sempre que algum pesquisador ou índio apareciam por lá, elas procriavam e aumentavam sua descendência, mantendo seu povo ainda vivo durante milênios enquanto todos somente pensavam que elas não passavam de uma lenda.

A Carta do Futuro do Pretérito

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Enquanto isso, no ano de 72.301 d. C. A carta enviada por Ubirajara do passado através da pele de cobra na garrafa do Pé de Garrafa foi recebida como um e-mail no computador do próprio Ubirajara no futuro. Ele havia conseguido enviar sua mensagem do passado para o futuro sem erros graças ao conselho das três fiandeiras. Uma hora antes de Ubirajara ligar a máquina do tempo no futuro, a carta do Ubirajara do passado chegou a sua caixa de mensagens, mas ele, muito atarefado quase concluindo a primeira viagem no tempo da história, acabara não percebendo imediatamente em seu computador, no qual trabalhava de forma hipnótica e fascinada com se estivesse prestes a dar a luz.

Concentrado em seu computador septuagésimo nono andar, no prédio da Unicamp, de onde dava para se ver das janelas de vidro enormes centenas de carros a voar no céu iluminado pela lua cheia e pelas luzes da cidade de campinas. Enquanto a cidade se movia fora do laboratório de física, Ubirajara estava concentrado em seu trabalho revolucionário. No entanto, enquanto trabalhava na programação da máquina do tempo, Ubirajara ouvira um sinal de mensagem não lida em sua caixa de mensagem, mas, tão concentrado em seu trabalho, deu de ombros e fingiu que não havia recebido nenhuma mensagem; fez isto até o sinal começar a incomodá-lo, então resolveu abrir o e-mail para se livrar daquele barulho chato. O e-mail dizia; De Ubirajara do passado para Ubirajara do futuro. Estranhando aquele título de mensagem, Ubirajara abriu, em fim, o e-mail.

Ao se dar conta do que estava acontecendo, Ubirajara arregalou os olhos e, espantado, começou a desligar a máquina do tempo, a fim de que ele e o Brasil não deixassem de existir, na esperança de que ele pudesse evitar, graças a um aviso dele para ele mesmo, que a viagem no tempo deveria ser cancelada, pois caso contrário, ele – Ubirajara – ficaria preso em um paradoxo temporal na terra encantada de Pindorama e ele – Ubirajara – desapareceria junto com o Brasil, de modo que os dois Ubirajaras – o do passado e o do futuro – lutavam ambos para não deixar seu mundo desaparecer. O Ubirajara do passado, encantado com os nativos, liderou-os até a vitória, escolhendo abrir mão da própria existência e da existência do Brasil para que Pindorama continuasse a existir. Enquanto que o Ubirajara do futuro, tentando proteger sua vida e sua família, escolheu tentar desligar a máquina do tempo antes que ele e o Brasil desaparecessem no ar. De modo que ambos os Ubirajaras lutavam entre si por interesses próprios, cada um tentando manter a existência do seu mundo possível. Mas, antes de desligar completamente a máquina do tempo, Ubirajara viu seu corpo e o Brasil começarem a desaparecer no ar.

 

 

O Desaparecimento do Brasil

Historia-do-Brasil

Nas Aldeias de todo o mundo, nas terras dos índios, era sempre dia. Nunca havia noite, estava sempre claro. Os homens não paravam de caçar, nem as mulheres de limpar, tecer e cozinhar. O sol ia do leste ao oeste e depois refazia o caminho, ia do oeste ao leste, seguindo assim. Mas teve um dia que o caso mudou. Quando Tupã, aquele que controlava tudo, havia saído para caçar, um homem muito curioso tocou no frágil Sol para saber como funciona. Então o Sol que dava luz e calor havia se apagado, havia quebrado em mil pedacinhos. Então as trevas havia reinado na aldeia. Tupã não se conformou com tal atitude do homem, e o transformou em um novo animal, que tinha as mãos douradas como o Sol que brilhava. E deu-se o nome àquele bicho de macaquinho-de-mão-d’ouro. Tupã então tratou de refazer o Sol. Mas ele só ia ao oeste e não conseguia voltar. Então criou assim a Lua e as estrelas para iluminarem a noite. E assim ia, o Sol ia até o poente, não voltava, e então vinha a Lua e as estrelas. Acabava a noite e o Sol voltava. Mas o sol sempre sorrindo ia e vinha. Um dia viu a lua, orgulhoso do que fez”.

Quando o primeiro raio de sol desapareceu no horizonte penetrando a escuridão na floresta, todos os nativos e todos os portugueses já estavam de prontidão para a batalha final que declararia quem seria o vencedor da guerra. Ubirajara estava com os nativos, e com eles também estavam Tupã, Angra, Mahyra, Rupave e Sypave, Angatupyry, Boitatá, Curupira, Caipora, Saci Pererê, Mãe D’água, Vitória Regia, Negrinho do Pastoreio, o Boto, Mandioca, Cobra-Honorato, Sapucaia Oroca, Açaí, Pingo d’água, Uirapuru, Mãe da Mata, a Princesa, Guaraná, Anhum, Jacaré Luminoso, Monge João Maria e Sumé.

Do outro lado estavam Cabral e os portugueses, e com eles estavam Tau, Kerana e seus sete filhos, Chandoré, o Caboclo D’água, Cabra Cabriola, Boi Vaquim, Boiuna, Ana Jansen, Cabeça de Cuia, Cabeça Satânica, o Lobisomem, a Mula sem Cabeça, Famaliá, Arranca-Línguas, A Porca e os Sete Leitões, Corpo Seco, Pisadeira, Cumacanga, Guajara, Homem dos Pés de Louça, João Galafuz, o Pai do Mato, a Cuca, o Chibamba, Mapinguari e todas as entidades malignas fantásticas, encantadas e assombradas do folclore brasileiro.

Enquanto o sol desaparecia lentamente no horizonte despertando o deslumbre dos guerreiros, estes se preparavam para começar a batalha final e, assim que o último raio de sol desapareceu completamente no horizonte escurecendo a densa floresta amazônica em meio às suas próprias sombras e sons nebulosos que deixavam o crepúsculo com um ar melancólico e macabro, a batalha final deu inicio. Nativos x Portugueses e Entidades de Luz x Entidades de Trevas.

Ao lado dos sambaquis, montes de concha e todo tipo de resíduo de origem humana, a batalha final começou. Assim que o último raio de sol desapareceu no horizonte, viram-se um espetáculo de luzes e sombras provocadas pelas tochas que ambos possuíam em mãos junto de suas armas; os portugueses com armas de fogo e os índios apenas com arcos e flechas e zarabatanas com veneno de sapo nas pontas. Mas a grande batalha final também foi travada entre seres sobrenaturais, fantásticos e fabulosos.

Enquanto os portugueses atiravam com suas armas de fogo, os nativos atiravam com flechas e zarabatanas com pontas cheias de veneno. De um lado dos sambaquis, via-se as luzes das tochas portuguesas e da arma disparando no escuro, do outro lado, via-se as tochas dos índios, que, de repente, começou a voar pelos ares com uma bola de fogo na ponta da flecha e enquanto os portugueses atiravam com suas armas de fogo, os nativos atiravam com flechas e zarabatanas pegando fogo, e outras com veneno de sapo na ponta.

Enquanto isso, no reino encantado de horror e terror de Pindorama, Ubirajara estava junto dos nativos para lutar com eles, e foi ele quem os ensinou a técnica de colocar fogo na ponta das flechas e atirar contra o inimigo. O grande conhecimento de Ubirajara sobre técnicas futuras permitiu que os índios tivessem muito mais vantagem do que todos os portugueses com suas armas de fogo, pois o conhecimento de Ubirajara deixou os portugueses em desvantagem intelectual muito grande. E Ubirajara, por sua grande sabedoria do futuro, liderou a batalha contra os invasores portugueses e, ensinou-lhes muitos truques para ganharem a batalha final e expulsarem os invasores de Pindorama para sempre.

Além da técnica de flechas de fogo ensinada por Ubirajara, o que permitiu a morte agoniante de muitos portugueses, este também ensinou aos nativos a técnica de defesa do escudo feito de madeira reforçado com kevlar sintetizado na Amazônia, que é um material parecido com o náilon, leve e flexível, mas que é cinco vezes mais resistente do que o aço das balas dos portugueses, o que deu ainda mais vantagem entre os nativos em relação aos invasores portugueses. O conhecimento elevado e futurístico de Ubirajara obviamente elevou as possibilidades dos nativos ganharem a guerra.

Enquanto os nativos armados com todo o conhecimento de Ubirajara derrotavam sem muitas dificuldades os portugueses em terra, os seres fantásticos de Pindorama se digladiavam na terra, na água e nos ares uns com os outros. Tupã e Angatupiri lutavam com Tau e Kerana; Angra lutava com Luison; Mahyra lutava contra Teju Jagua; Rupave lutava contra Moñai, Sypave lutava contra Jaci Jaterê; Boitatá lutava contra Mboi Tu’i; Curupira lutava contra o Homem dos Pés de Louça; Caipora lutava contra o Arranca-Línguas; O Saci lutava contra Ao Ao; O Boto lutava contra o Curupi; A Vitória Regea lutava contra o Caboclo D’água; Mandioca lutava contra Ceuci tentando impedir o nascimento de Jurupari; Negrinho do Pastoreio e a Mão Negra lutavam contra Ana Jansen; a Cobra Honorato lutava contra a Porca e os Sete Leitões; Açaí lutava contra a fada dos Dentes; Pingo D’água lutava contra Cotaluna; Uirapuru lutava contra os Cupiendiepes; A Mãe da Mata lutava contra o Pai do Mato; A Princesa lutava contra a Desgraça Pelada; Guaraná lutava contra Cuca; Jacaré Luminoso lutava contra João Galafuz; Monge João Maria Lutava contra Guajara e Sumé lutava contra a Mula sem Cabeça.

Depois de uma batalha sangrenta no reino encantado de Pindorama, em fim, os nativos conseguiram matar a maior quantidade dos portugueses e aprisionar o restante, poupando suas vidas. Os seres fantásticos se digladiaram, mas apesar da batalha intensa, todos eram imortais e só se machucaram muito uns aos outros, mas nenhum deles morreu. Como os nativos conseguiram derrotar a  maioria dos portugueses, logo os seres fantásticos foram, pouco a pouco, desaparecendo no meio da mata e, em fim, ficou confirmada a vitória dos nativo de Pindorama, que pegaram o restante de invasores portugueses vivos e os enviou de volta para Portugal para nunca mais voltarem. E todos comemoram a vitória dos nativos liderados por Ubirajara e a expulsão total dos invasores de Pindorama. Mas, assim que todos começaram a se dispersar no mar Ubirajara começara aos poucos desaparecer no ar, pois, tendo os nativos vencido, seria como se ele nunca tivesse existido, já que ele vem de um Brasil do futuro, que, neste momento, também começava a desaparecer em pleno ar.

As Três Fiandeiras de Deus

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Ubirajara escolheu renunciar não só a existência futura do Brasil, mas também a própria existência, pois, na medida em que, caso ele viesse a ganhar a guerra entre nativos e portugueses, lutando pelo lado dos nativos como escolheu fazer, se ele ganhasse a guerra, a sua vitória o faria desaparecer no tempo e no espaço, pois se o Brasil de onde ele saiu no ano de 72.301 d. C desaparecesse, ele próprio desapareceria, deixando de existir em um mundo possível.

Para ajudar a devolver o Brasil aos nativos, Ubirajara se aproximou dos nativos e se fez bem quisto entre quase todas as tribos, que o achavam engraçado por causa de suas roupas diferentes que aos olhos dos nativos seria como parecerem fantasias de palhaço. Ubirajara também rapidamente conseguiu o respeito de Saci e Curupira por ter conseguido pegar a garrafa do Pé de Garrafa ceifando sua perna, deixando o tão temido vilão da floresta perneta, esse fato transformou Ubirajara num verdadeiro herói entre os habitantes da Amazônia, fossem eles os reais ou os encantados, e quanto aos seres malignos, estes passaram a odiar Ubirajara, pois o Pé de Garrafa era o gerente da região em que foi decepado por Ubirajara na floresta, ele tomava conta daquela área para Tau, o demônio que é a encarnação de Satanás, e tinha um grande prestígio entre os orixás, demônios e seres malignos que lutavam para que os portugueses invadissem e roubassem as terras dos nativos brasileiros de Pindorama.

Mesmo sabendo que, caso enviasse sua mensagem para o futuro pedindo ajuda e descrevendo sua situação no passado, as pessoas do futuro lutariam para não permitir que todas elas e o Brasil simplesmente desaparecessem no tempo e no espaço, e esta guerra se tornaria ao mesmo tempo fantástica e cronológica, entre pessoas do passado e pessoas do futuro que lutam por sua existência. Mesmo não sabendo se conseguiria alcançar justamente o ano e o dia em que ligou a máquina do tempo afim de que alguém pudesse impedi-lo de viajar no tempo ou lhe desconectasse dos eletrodos ligados ao computador, permitindo o retorno à cronologia cósmica original, mesmo assim Ubirajara resolveu arriscar e tentar, pois ao mesmo tempo em que queria lutar pelo bem e libertar os nativos do julgo e da posse portuguesa, ele também não queria que todo o Brasil em que vivia no futuro e seus familiares, sua mãe, sua mulher, seus dois filhos simplesmente deixassem de existir, então acabou escrevendo a mensagem pintada com a tinta vermelha do pau brasil em pele de cobra deixada pela mata em época de troca de pele, e aproveitada por Ubirajara para escrever a sua mensagem ao futuro, pedindo ajuda e contando tudo o que havia acontecido, mas a tentativa de Ubirajara fora um tiro no escuro, pois tudo iria correr bem se ele conseguisse enviar justamente para si mesmo algum tempo antes de ele ligar a máquina do tempo, impedindo-se a si próprio de liga-la e então voltar para casa como se nunca tivesse saído de lá.

Confuso com toda a incerteza de sua situação no futuro, pois sabia como enviar a carta, mas não sabia se ela conseguiria chegar a si próprio no futuro, pois ela poderia parar em qualquer tempo e espaço no futuro, o que Ubirajara não saberia nunca se sua carta chegaria a si próprio no futuro, impedindo-se a si mesmo de viajar no tempo ou não; inseguro com sua nova situação, Ubirajara é aconselhado por Saci Pererê de procurar a três fiandeiras que teciam o destino por Deus, e saber deste oráculo o que Deus havia reservado para os fios das três fiandeiras que com eles tecem o passado, o presente e o futuro.

Disfarçado de mercador, Ubirajara percorreu a floresta na direção que o Saci havia lhe indicado no último encontro, mostrando-lhe para qual direção ficava o reino que era o núcleo da própria realidade daquele mundo, o mundo das três fiandeiras que teciam o destino ordenado por Deus. Chegando ao local indicado por Saci, Ubirajara não viu absolutamente nada de diferente e então pensou não ter compreendido a orientação de Saci, e depois de esperar ali por meia hora e não ver nada de diferente na floresta, Ubirajara começou a se virar para ir embora, pensando não ter entendido bem a orientação que Sacia havia lhe dado outrora, mas, quando virou seu rosto rapidamente para voltar para a aldeia onde estava hospedado, Ubirajara viu surgir a sua frente uma intensa luz branco-alaranjada que lhe mostrava outro mundo dentro da floresta amazônica; um mundo feito de imensos fios trançados por todos os lados e, no meio do alto de uma pedreira, Ubirajara vê três senhoras fiando todos aqueles fios sem cessar. Ele então resolve entrar no mundo que lhe surge aos olhos espantados no meio da floresta amazônica bem exatamente no mesmo lugar do espaço e do tempo em que ele estava anteriormente, como uma realidade paralela que paira no espaço e no tempo e fia todos os acontecimentos escolhidos por Deus para conduzir a história do universo, da vida e do homem.

Assim que adentrou ao mundo dos fios do destino, Ubirajara foi imediatamente ter com as três fiandeiras para saber o que elas lhe revelariam sobre sua condição atual, se sua mensagem enviada ao futuro iria permitir que ele pudesse evitar sua própria viagem no tempo, e o quê Deus estava tecendo para o seu destino.

O mundo das três fiandeiras era todo trançado de fios brancos e pretos que tomam todo o mundo, tendo em seu centro a pedreira onde estão sentadas as três fiandeiras a fiarem todo aquele mundo. Se achegando das senhoras, reparou que elas eram muito, muito velhas, vestiam todas vestidos idênticos de fios pretos e brancos, mas bordados de tal forma que sua estética se contrastava com a estética dos fios do próprio mundo, dando a ambos uma aparência sombria e caleidoscópica em preto e branco; ao se aproximar o bastante para atrair os olhares hipnóticos das três fiandeiras, Ubirajara lhes disse:

− Senhoras? O Saci me indicou o vosso mundo…

E tão rapidamente foi interrompido por uma das velhas, que disse:

− O que queres de nós?

− Eu preciso saber se a minha carta chegará até mim no futuro para eu impedir a mim mesmo de viajar no tempo, ou se eu ficarei para sempre preso neste mundo.

Então, depois de um minuto de silêncio melancólico e sombrio, as três fiandeiras responderam de forma sincronizada e profética, dizendo:

− Você nos criou grandes problemas rapaz! Ao viajar no tempo você simplesmente criou um paradoxo temporal e se prendeu nele. A única forma de tudo voltar ao normal é se sua carta chegar até você mesmo impedindo-lhe de viajar no tempo, mas deveis ter em mente que, como o tempo simbólico utilizado por vós no futuro é distinto do tempo simbólico de Pindorama, sua carta deve ser datada corretamente levando em consideração a fusão de horários e datas em relação ao mundo do qual você enviou a carta e o mundo ao qual deveria recebê-la. Os fios que tecem o destino do universo, da vida e do homem são feitos de liberdade, e, independente do que escolherdes, vós é que, com a vossa liberdade, produzireis os fios com os quais tecemos a túnica de Deus.

E em seguida, Ubirajara fora transportado em um milésimo de segundo para o mundo encantado de Pindorama novamente, tendo a sua frente o mundo das três fiandeiras desaparecido completamente de sua realidade.

 

O Paradoxo Temporal

paradoxos temporais

A carta enviada pela garrafa de vidro jogada ao mar no mundo encantado de Pindorama chegou transformada em e-mail em pleno ano de 72.301 d. C, implorando que alguém desligasse os eletrodos ligados ao computador que permitiu Ubirajara viajar no tempo de uma forma virtual. Ubirajara acabara ficando preso no mundo encantado de Pindorama que surgiu em um universo paralelo quando Cabral roubou o Brasil.

Para enviar sua mensagem do reino encantado do Brasil pré-cabraliano, Ubirajara imaginou que, se houvesse uma forma de comunicar com alguém no futuro, seria enviando uma carta dentro de uma garrafa e jogando-a ao mar, pois assim, quando ela estivesse a desaparecer no horizonte, iria se transportar imediatamente para o futuro, só era preciso ter cuidado com o que as três fiandeiras lhe alertou; ou seja, levar em consideração a diferença de datação simbólica dos dois mundos, pois esta era a única possibilidade de entrar em contato consigo mesmo no futuro impedindo-lhe de viajar no tempo. Mas como conseguir uma garrafa num tempo e em um lugar específico do passado em que os indígenas não conheciam a fabricação do vidro? Para conseguir a garrafa para enviar a carta escrita com tinta tirada do pau Brasil e escrita em pele de cobra, Ubirajara passou por uma aterrorizante aventura. Como os índios não tinham conhecimento da fabricação do vidro, Ubirajara havia escutado de alguns nativos que naquele mundo vivia uma entidade maligna que possuía uma garrafa presa a seu pé, Ubirajara então assumiu a missão de roubar a garrafa do Pé de Garrafa com o propósito de utilizá-la para enviar uma mensagem ao futuro pedindo ajuda para libertá-lo do mundo encantado do Brasil. Uma entidade sombria parecida com um homem muito grande que tinha as extremidades circulares, maciças, e fixava vestígios inconfundíveis de seu ser. Era completamente cabeludo e só tinha uma perna, a qual terminava em casco em forma de fundo de garrafa.

Ubirajara era um cientista brilhante, mas também era um homem corajoso e, para se libertar de Pindorama, ele recorreu a uma atitude quase suicida, mas, sendo corajoso, Ubirajara preferiu morrer tentando escapar daquele mundo de horror e terror, se preciso fosse, do que simplesmente se acovardar diante da situação e nunca lutar pela sua liberdade.

Ouvindo rumores de que o Pé de Garrafa vivia a caminhar pelas madrugadas sombrias da floresta amazônica, Ubirajara, numa noite densa, nebulosa e sombria, saiu pela escuridão da floresta melancólica marcada pelo canto da Mãe da Lua com seus gritos de pavor, e ficou na espreita sobre uma árvore na esperança de que conseguisse encontrar o Pé de Garrafa, uma entidade muito inteligente e diabólica, e que seria muito difícil de encontrar e mais ainda de roubar-lhe a garrafa do pé, mas Ubirajara resolveu, mesmo assim, correr o risco e tentar.

Durante uma semana inteira Ubirajara passou suas madrugadas empoleirado em cima de um pé de caju, na espreita para ver se conseguia uma oportunidade de roubar a garrafa do Pé de Garrafa e com ela enviar seu pedido de socorro para o futuro, na esperança que ela se transformasse em um e-mail virtual que deveria ser encontrado em algum lugar do futuro. Numa madrugada gélida e nebulosa na floresta amazônica, Ubirajara começou a ouvir sons estranhos vindo da mata. Primeiro ouviu gritos estrídulos e amedrontadores, depois mais a frente começou a ouvir vozes familiares, parecendo ser a voz de seus familiares e amigos.

Encantado com as vozes de seus familiares e amigos ressoando nas árvores enormes da floresta, Ubirajara acabou descendo do pé de caju, e, numa ilusão alucinógena provocada por Pé de Garrafa, Ubirajara saiu a perambular em meio à mata densa da floresta procurando por seus familiares e amigos, pensando que de alguma forma eles também haviam viajado no tempo para ajuda-lo a se libertar do universo paralelo de Pindorama, onde os seres fantásticos, assombrações, encantados e monstros da mitologia tupi-guarani e do folclore brasileiro, entidades das mais diversas, de origem exclusivamente brasileira, com uma autenticidade fabulosa e uma ancestralidade milenar viviam em guerra constante. Os bons espíritos, orixás, fantasmas e entidades fantásticas do bem, lutavam para libertar Pindorama das garras gananciosas de Portugal, pois quando Ubirajara viajou do futuro para o passado, ele pousou sua mente justamente no dia em que Cabral invadiu o Pindorama, dando origem ao Brasil. E nesta guerra, muitos maus espíritos, orixás malignos, fantasmas, encantados e entidades fantásticas lutam pela tomada do poder em Pindorama para transformá-la em Brasil, enquanto os bons espíritos e entidades de luz lutam para libertar Pindorama de se tornar Brasil, provocando o surgimento de outro mundo possível existente em uma realidade paralela, um mundo onde o Brasil nunca existiu, pois os nativos brasileiros ganharam a guerra com os portugueses e os expulsou de Pindorama, não vindo a existir o Brasil.

No meio desta guerra sobrenatural e fantástica de horror e terror, Ubirajara fora atraído para a presença de Pé de garrafa que, no escuro da mata densa e nebulosa, surgiu do nevoeiro esbranquiçado provocado pelo frio e deu de cara com Ubirajara completamente hipnotizado pelo Pé de Garrafa. No entanto, por um segundo Pé de Garrafa se desconcentrou de seu controle mental por causa de um barulho vindo do outro lado da mata, e neste instante Ubirajara despertou de seu transe e, se dando conta de que estava junto do Pé de Garrafa, sumiu no meio da mata enquanto o Pé de Garrafa desatento por um segundo olhando para a escuridão no horizonte da selva amazônica, e este, quando se virou, notou a ausência de Ubirajara e, enfurecido, passou a rodar a mata escura e densa procurando Ubirajara.

O Pé de Garrafa procurava endoidecido por Ubirajara e, de repente, o Pé de Garrafa sentiu seu pé ser cortado e, quando ele olhou para baixo, viu Ubirajara deitado ao chão no meio da mata escura com um facão afiado na mão, e assim que a perna de garrafa do Pé de Garrafa fora cortada violentamente, Ubirajara pegou ligeiro, a garrafa com o pé preso dentro e sumiu na mata enquanto o Pé de Garrafa urrava de dor sem a sua perna e sangrava um sangue roxo que se espalhou pela noite na floresta iluminada pela lua rasgada em nevoeiros sombrios.

Ubirajara agora estava em um paradoxo temporal e ao mesmo tempo um conflito moral, pois se ele de fato conseguisse enviar sua carta ao futuro e alguém, que não ele próprio, a recebesse como um e-mail e a levasse até as autoridades competentes como a Unicamp, eles não iriam fazer absolutamente nada para que eu retornasse para o futuro, pois, caso isto acontecesse, o Brasil simplesmente deixaria de existir, pois no futuro do pretérito alternativo em que estava preso no espaço e no tempo, indicava um mundo onde Cabral e os portugueses perderam a guerra e os nativos brasileiros, com a ajuda de entidades fantásticas como o Saci-Pererê e o Curupira, conseguiram expulsar todos os estrangeiros invasores das terras de Pindorama, e neste mundo, neste universo alternativo o Brasil não existiria, e por isso se o receptor da mensagem virtual do passado para o futuro jamais iria realizar qualquer trabalho para levá-lo de volta para o futuro, pois se assim o fizesse, o receptor faria o mundo onde o Brasil existe simplesmente deixar de existir; naquele momento, Ubirajara ficara muito decepcionado, pois compreendera que ele havia ficado preso no mundo encantado de Pindorama que surgiu após a invasão dos portugueses em terras tupiniquins. Por outro lado, se Ubirajara, sem a ajuda das autoridades no futuro, conseguisse modificar o presente para transformar o futuro, ele teria a chance de lutar ao lado dos verdadeiros donos do Brasil, e neste caso este seria como se nunca tivesse existido, pois Ubirajara iria devolver aos nativos de Pindorama as suas terras roubadas pelos portugueses, caso ele sacrificasse sua volta ao futuro e permanecesse preso ao passado, mas caso conseguisse de alguma forma voltar ao futuro, Ubirajara faria o mundo onde os nativos vencem a guerra, desaparecer, pois neste caso o Brasil tomaria o lugar de Pindorama.

Ubirajara tinha nome de nativo tupi-guarani e teve de fazer uma escolha moral: decidir para que lado da guerra ele iria lutar, e neste grande conflito existencial, moral e temporal, Ubirajara depois de algum tempo vendo aquela cena horrível e cheia de terror de uma terra milenar sendo invadida por ladrões de terras, os piratas da mata que vieram pelo mar, decidiu que aquilo era um crime hediondo que estava gerando um verdadeiro holocausto de nativos, e resolveu abdicar de sua libertação do mundo encantado de Pindorama para lutar pela sua existência, permanecendo neste mundo onde o Brasil nunca existiu e, no futuro, existia a versão original de Pindorama, porém, onde os seres fantásticos e entidades sobrenaturais do folclore brasileiro eram apenas lendas e mitos e estes, neste mundo, não se misturavam à realidade como no mesmo mundo, porém invertido, do passado; gerando uma linguagem cósmica universal que se estrutura como um oposto binário relacionado a uma rede quase infinita de mundos possíveis interligados uns nos outros que vão se construindo aleatoriamente sobre às rédeas do destino costurado pelas três fiandeiras de Deus.

 

A Máquina do Tempo

pindorama

Por favor. Alguém me ajude! Eu me chamo Ubirajara, eu sou professor de epistemologia, física, antropologia e psicologia da Unicamp, no Brasil. Eu escrevo este e-mail na esperança de que um dia alguém o encontrará em algum lugar da rede mundial de computadores, e se você encontrou este e-mail, é porque eu estou morto agora. Do lugar onde escrevo consegui enviá-la dentro desta garrafa transparente tapada com uma rolha que você neste momento deve ter encontrado a boiar sobre um rio ou sobre o mar. O importante é que você encontrou este e-mail transportado em uma garrafa a boiar no mar, pois esta é a forma que eu consigo, do mundo virtual em que estou enviar mensagens para o mundo real onde você está.

Você que recebeu este e-mail, por favor, eu imploro sua ajuda. Apesar de eu já estar morto há esta hora, este e-mail precisa chegar ao conhecimento das autoridades brasileiras imediatamente. É de importância suprema que este e-mail chegue até as autoridades brasileiras; o país corre sério risco de entrar em um paradoxo temporal e desaparecer no tempo e no espaço.

Eu sei que a história que eu vou contar aqui é difícil de acreditar, mas é a mais pura verdade e, por mais que seja improvável, pensem que não é impossível. Eu, Ubirajara, o professor da Unicamp, inventei no ano de 72.301 d. C a primeira máquina do tempo. Agora eu estou preso em uma terra encantada conhecida como Pindorama; segundo pude ouvir dos nativos. Pindorama é a terra encantada do Brasil antes de Cabral roubar as terras dos nativos brasileiros. Eu sei que isso lhe parece fantástico demais, mas eu juro que é verdade. Ai! Meu Deus. Vocês precisam me tirar daqui, eu não sei mais quanto tempo irei sobreviver neste lugar que parece mais uma fábula de horror.

Mas não adianta me desesperar, pois se você está lendo este e-mail, é porque eu já estou morto a este momento. No entanto, é de suma importância que autoridades intelectuais da Unicamp tenham conhecimento do que eu irei relatar neste e-mail a partir de agora.

No dia sete de setembro de 72.301 d. C, eu fiz a minha máquina do tempo funcionar. Esta máquina é um computador, sim um computador; ou você imaginou mesmo que carros, cabines telefônicas e máquinas giratórias iriam fazer o ser humano viajar no tempo? Isso é coisa de filme. Eu inventei um computador capaz de realizar viagens virtuais no tempo a partir da resolução do problema P versus NP em circunstâncias tão somente virtuais, eu não entrarei nos cálculos que utilizei para resolver o problema, pois esta pele de cobra com a qual eu escrevo com tinta tirada de uma árvore da Amazônia não daria para demonstrar os milhares de cálculos necessários para se resolver o problema; sim, eu vim parar no meio da floresta amazônica numa terra encantada chamada Pindorama.

Em Pindorama a fantasia é a realidade. Parece que, quando Cabral roubou o Brasil, ele também roubou seu encanto mágico. Esta terra nada tem de parecida com o Brasil do futuro, esta terra é fabulosa, cheia de criaturas sinistras, macabras, perversas e assombrosas vivendo no meio da floresta amazônica. Em Pindorama a fantasia é a realidade e a magia é uma prática comum para todo tipo de propósito. Esta terra é mágica, porém muito perigosa, eu estou preso em uma dimensão temporal em um mundo paralelo em que existem seres fantásticos e fabulosos de arrepiar. Um reino de fantasia sombria e nebulosa.

Mesmo que tenha custado a minha vida, vale a pena que as pessoas tenham conhecimento deste universo ao mesmo tempo dantesco e kafcaresco. Uma terra fantástica, sim, eu não estou ficando louco. Por mais incrível que pareça, os mitos e lendas do folclore brasileiro estavam certos, o nosso folclore descreve os seres que viveram na terra encantada de Pindorama, e, acredite, eu também não consegui acreditar quando cheguei até este lugar, mas eu juro por Deus! Sim. Deus, pois depois do que aqui me fez acreditar que Deus é a entidade mais fácil de acreditar no mundo, pois depois das entidades que eu vi neste lugar, a existência de Deus e da vida após a morte não é velada por um véu de Maya como é no futuro; aqui, nesta terra, neste lugar no espaço e no tempo, fantasia e realidade são a mesma coisa.

Eu vou descrever esta terra encantada chamada Pindorama, que é um lugar fantástico cheio de horror e terror que se criou num mundo possível depois da invasão de Cabral em terras tupiniquins. O roubo de Cabral criou esta realidade paralela no passado na qual eu estou preso.

Como eu já estou morto, este e-mail ao menos se, e somente se, tiver sido encontrado por alguém bastante honesto e esclarecido da sua urgência e importância, será um registro histórico desta terra encantada; descreverei suas formas, sua natureza, sua arquitetura, seus comportamentos, sua cultura, na esperança de que um dia alguém no futuro, ou talvez eu mesmo, possa receber este e-mail e me desligar do computador, onde neste instante eu estou morto sentado em uma cadeira de computador com eletrodos conectados em minha cabeça, transmitindo pela energia que o cérebro envia para o computador projetar a minha imagem em 6D no tempo e no espaço de forma virtual. Acontece que esta máquina é mais perigosa do que eu imaginei, pois se este e-mail chegou até você é porque eu fiquei preso neste mundo fantástico de horror e terror, e por isso eu morri, provavelmente fiquei aqui no laboratório de Física da Unicamp conectado ao computador com os eletrodos no cérebro que, possivelmente, se um dia encontrarem meu corpo ele será somente uma caveira encostada em uma cadeira de computador olhando para ele a projetar minha própria imagem em diversos apuros na floresta, onde eu realizei a primeira viagem no tempo da história, mas que foi realizada sob um grande segredo, inclusive às autoridades e ao reitor da Universidade, de modo que realizei este projeto às escuras, não revelei para absolutamente ninguém.

O panorama de Pindorama é a descrição que eu irei fazer da terra encantada de Pindorama, que existia antes da invasão e do roubo das terras tupiniquins por Cabral e seus jagunços portugueses. O panorama de Pindorama é a minha descrição real de um mundo que se tornou possível em uma realidade paralela depois que Cabral roubou o Brasil.

Bem, vamos lá: esta terra é realmente encantada, não sei como explicar, mas aqui fantasia e realidade são exatamente a mesma coisa, e por isso muitos seres fantásticos vivem neste lugar, que é basicamente uma imensa, sombria, densa, melancólica e macabra floresta amazônica.

Aqui, a fada dos Dentes é real, sim, eu nunca imaginei que um dia eu, justamente eu, um físico ateu, iria dizer que a Fada dos Dentes é real. Mas sim, eu estou dizendo. Só que a Fada dos Dentes desta terra de horror e terror não tem nada de boazinha como a Fada dos Dentes contada nas histórias da Disney. Aqui em pindorama, a terra encantada do Brasil, a Fada dos Dentes é uma entidade feminina, de cabelos esvoaçantes, com olhos negros e arregalados, com a boca toda aberta e sem nenhum dente, com o rosto cortado e sangrando, com uma varinha na mão, vestida com um vestido preto e curto, flutuando no ar com asas negras pequenas a bater tão rápido quanto as asas de um beija-flor do inferno.

Aqui também existem alguns índios alados, com asas de morcego, que ceifam com uma meia-lua a vida na terra, seja ela a flora ou a fauna, promovendo o equilíbrio entre a vida e a morte para que o lugar não fique com um controle de natalidade adequado para a natureza.

Aqui existe uma sereia que se disfarça de mulher bonita e sensual, porém fatal, ela hipnotiza os índios e, atraindo-os para a escuridão do mar, onde ela os devora vivos com seus dentes afiados. Aqui tem uma princesa que foi enfeitiçada por uma bruxa e transformada em uma cobra. Aqui tem cavalos fantasmas que aparecem e desaparecem do nada. Tem cavalo de três pés. Sim, um cavalo de três pés.

Aqui tem, pasmem: automóveis encantados, sim. Ao que parece, eles são a manifestação do paradoxo temporal que eu criei quando resolvi ligar a máquina do tempo virtual. Esses carros do futuro surgem no meio da floresta escura e sombria ou a voar no céu sobre o mar com faróis e luzes ligadas e assusta os índios. Eu mesmo já quase morri de susto por causa de um desses carros encantados que atravessam a floresta.

Aqui tem uma entidade demoníaca que leva a desgraça por onde passa; e Curupira e Saci Pererê são reais, sim eles são reais, e são do bem, não são do mal. Todos os personagens do folclore brasileiro nesta terra são reais, alguns lutam pelo bem e outros pelo mal. E a Cuca é de fato Muito macabra e vive no meio da floresta amazônica.

Aqui tem homens com pés de louça. Duendes, deuses, demônios e entidades fantásticas de toda a sorte. Vocês acreditam que no meio da floresta amazônica vivem dos povos distintos e opostos, e estes dois povos são formados por anões e gigantes. Sim, A floresta amazônica tem anões e gigantes que vivem em guerra.

A pisadeira ataca o sono dos índios e leva alguns até a morte. Existem zumbis com seus esqueletos a vaguear pela mata. Existe uma baronesa e sete filhos que foram transformados em uma porca e sete leitões. Aqui tem um gigante que arranca a língua das pessoas.

Não é raro ver também procissões de almas a vagar pela floresta. E aqui tem uma entidade muito característica do Brasil, que se chama Chibamba e é uma entidade maligna que tem um chapéu de palha na cabeça e o corpo enrolado e uma longa esteira de bananeira, e estripa indiozinhos, deixando seus corpos completamente sem órgãos. Aqui tem um monstro enorme que só tem um olho grande que cobre o seu rosto e uma boca enorme bem no meio do estômago.

Aqui também tem entidades que possuem os pés voltados para trás, como o Kilaino. Aqui tem um índio que se transformou em pedra após cometer suicídio. Uma ilha cheia de cavalos marinhos. Gigantes e monstros de todo o tipo. A Mula sem cabeça é uma entidade apavorante que sempre é vista a relinchar durante as noites escuras na floresta amazônica.

O lobisomem é uma criatura real e extremamente perigosa. Aqui tem demônios sem cabeça e pessoas e animais sem cabeça. Tem homens com cabeças de cuia. Homens com pés de garrafa. Minhocas gigantes que destroem a floresta no subsolo. Espantalhos, mãos negras fantasmas sem corpo flutuando pela floresta durante o dia e a noite e muitas outras coisa fantásticas.

Esta é a terra em que eu estou preso, lutando contra monstros, anões canibais, gigantes, duendes, fantasmas e todo o tipo de perigo da floresta. E por isso, imploro que a pessoa a receber este e-mail corra até o laboratório de Física da Unicamp e pelo amor de Deus, tire os eletrodos da minha cabeça se eu já estiver mesmo morto, mas se ainda der tempo, impeça-me de viajar no tempo. Caso contrário, eu ficarei preso aqui para sempre e o Brasil de vocês desaparecerá no espaço e no tempo.

 

Onça-Boi

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No crepúsculo sombrio e nebuloso da floresta amazônica estava um caçador a procurar por qualquer animal cuja pele e a carne pudesse lhe gerar um bom dinheiro no mercado negro. Durante o dia já havia conseguido capturar duas cobras e um porco do mato, mas queria mais algum animal para complementar sua renda, por isso resolveu continuar sua caçada mesmo vendo a noite se aproximar.

Em determinado momento, enquanto olhava fixamente a mata densa da floresta iluminada somente por alguns poucos raios do sol que ainda não havia se posto completamente, ouviu um barulho de passos por trás de um arbusto e, se preparando para atirar, se ajoelhou e ficou na espreita esperando o que quer que fosse sair de trás daquele arbusto; no entanto, o silêncio se fez novamente e alguns segundos depois o caçador foi surpreendido com um rosnado forte atrás de si; ele então se virou lentamente e viu uma enorme onça pintada com quatro patas de boi e, enquanto a olhava meio de lado, viu surgir à sua frente do meio do arbusto outra onça pintada com quatro patas de boi a rosnar para ele; sem saída, pois, por mais que atirasse em uma a outra imediatamente o mataria, ele ficou alguns segundos parado no meio das duas onças-boi a pensar em como sairia daquela enroscada que poderia custar a sua vida.

Depois de alguns segundo refletindo enquanto olhava espantado e aterrorizado para as onças-boi, o caçador viu à sua frente uma árvore não muito alta que seria difícil de subir, mas também não muito baixa que seria fácil de ser capturado pelas onças-boi; então ele deu um tiro para o alto a fim de assustar as onças-boi e saiu correndo em direção á arvore e rapidamente subiu nela antes que as onças-boi o devorassem vivo.

Uma delas até chegou a morder sua bota, prendendo-o pelo pé até que ele conseguisse soltar seu pé da bota e, no meio da luta, acabara deixando sua espingarda cair ao chão. Bem, depois de subir até o alto da árvore, o caçador se acalmou, pois pensou:

− Bem, agora é só esperar essas onças-boi sentirem fome, sede e sono e depois irem embora para eu voltar para casa.

No entanto, o que o caçador desavisado não sabia era que as onças-boi trabalham em dupla na busca por comida e, deste modo, ambas montaram guarda sob a árvore. Depois de algumas horas, o caçador começou a ficar com fome, sede e frio e, olhando para baixo, viu uma das onças-boi se retirar e sumir na mata, logo se alegrou, pensando:

− Pronto! Agora a outra onça-boi também vai sair para procurar comida ou beber água, e assim que ela sair eu vou embora para minha casa.

Todavia, passaram-se 2 h e a onça-boi ainda continuava na espreita; mais 3 h depois e ela ainda não havia saído de baixo da árvore. De repente então o caçador viu a outra onça-boi chegar arrastando uma capivara presa à sua boca e leva-la para a outra onça que havia ficado na espreita.

Naquele momento o caçador começou a sentir medo, apesar de estar acostumado com os perigos da mata, ele nunca havia visto aquele animal fantástico, e com tamanha inteligência. Já sem ter o que fazer a não ser esperar, o caçador, já cansado, resolveu tirar um cochilo na esperança de que quando ele acordasse as onças-boi já teriam ido embora.

No entanto, 3 h depois, o caçador acordou e viu sob a árvore somente uma das onças-boi, e tão logo pensou que em breve a outra também iria. Todavia, 2 h depois o caçador viu a outra onça-boi chegar e montar guarda enquanto a que estava montando guarda saiu. O caçador olhou aquilo espantado, as onças-boi eram tão inteligentes que criaram uma forma de dividir o trabalho da caçada a fim de não perderem sua presa. Naquele momento o caçador entrou em pânico, pois sabia que, por mais que ele esperasse as onças-boi não iriam embora, pois uma montava guarda enquanto a outra ia se alimentar, matar sua sede e dormir e depois trocavam de lugar.

Não tendo mais o que fazer a não ser esperar que em algum momento aquelas onças-boi fossem embora e desistisse de comê-lo, o caçador ficou na árvore e sua espera durou dias a fio. Quando a fome apertou, o caçador começou a comer as folhas da árvore, bem como as lavas que por ela andavam. Mas a sede começou a apertar e ele deu sorte porque, quando chovia, conseguia matar sua sede.

Desta forma agonizante e desesperadora o caçador viveu durante três meses até que não houvesse mais uma única folha na árvore; ele havia comido todas as folhas e as chuvas se tornaram cada vez mais raras. Muito magro, fraco, com fome e com sede, não se aguentou e caiu enquanto dormia, e tão logo ele caiu as duas onças-boi, três meses depois, o devoraram vivo.

Mapinguari

Mapinguari1

No meio da floresta amazônica, um velho índio já em idade muito avançada, estava só em sua oca enquanto os homens jovens caçavam e as mulheres lavavam mandioca no rio. Em determinado momento, deitado em sua rede, o velho índio começou a se sentir estranho, então se levantou com a intenção de pedir ajuda ao seu companheiro de oca; mas o velho índio, antes de conseguir acordar seu companheiro, sentira que algo dentro dele estava se transformando, de dentro para fora, viu seu corpo se transmutar completamente, sua estatura chegou a quase dois metros, seu corpo, seu corpo começou a crescer pelos por toda parte até se tornar peludo que nem um coatá, seus pés se transmutaram em pés de burro e se voltaram para trás, seu rosto se transformou completamente, passou a ter somente um único olho enorme bem no meio de sua cara e sua boca desceu para o estômago, tornando-se enorme e cheia de dentes afiados.

Quando os jovens índios que haviam saído para caçar e as mulheres que haviam saído para lavar a mandioca retornaram a aldeia, viram aquele monstro enorme sair de dentro da oca com o índio debaixo do braço e, saltando ligeiro, foi até o centro da aldeia e, jogando o índio ao chão, com suas imensas unhas começou a estripar o índio ainda vivo e, arrancando cada pedaço de seu corpo, ia colocando-os em sua boca cheia de dentes afiados, grande como uma solapa, rasgada à altura do estômago.

Os índios, muito assustados com a presença macabra daquele mostro na aldeia, se dispersaram no meio da floresta enquanto o monstro devorava o velho índio que dormia tranquilamente na rede em sua oca.

Depois de comer o índio, o monstro saiu ligeiro a saltar pela floresta e, durante a noite, viu dois caçadores de onça no meio da mata. Eles sequer perceberam sua presença, mas, por acaso, um deles apontou a lanterna em sua direção e viu aquele monstro gigante com um olho no meio da cara e uma enorme boca no meio do estômago a rosnar muito alto e de forma assustadores; os caçadores, totalmente espantados e apavorados com a presença sinistra daquele monstro durante a noite no meio da floresta amazônica, posicionaram suas armas e começaram a atirar diversas vezes no monstro, mas por incrível que pareça, os seus grandes pelos o tornavam completamente invulnerável à bala e, enquanto atiravam, viam-no se aproximar cada vez mais enquanto eles andavam para trás a fim de aumentar a distância entre ele mas, como era de se esperar, assim que a munição dos dois acabou, ambos levaram uma patada forte no meio do peito e voaram a uns dez metros de distância e caíram sobre o tronco de duas árvores, uma ao lado da outra e, olhando aquele monstro se aproximar o da esquerda viu o seu amigo da direita ter sua cabeça arrancada pela boca enorme do monstro e, completamente apavorado, começou a se rastejar no meio da mata enquanto o seu amigo era devorado pelo monstro e depois de rastejar durante uma meia hora, pensou estar a salvo e se recostou em uma outra árvore, mas quando deu um suspiro de alívio, viu surgir da escuridão da mata aquele monstro medonho, e este, em um segundo arrancou a sua cabeça e a devorou, deixando ali no tronco da árvore o seu corpo sem cabeça para mostra aos índios e caçadores da região que aquelas terras eram dele, o monstro Mapinguari.

Mãe-da-Peste

névoa

Numa madrugada fria e sombria entoada pelo canto melancólico da Mãe-da-Lua, cujo canto estranho lembra uma gargalhada de dor, cercou a escuridão da noite iluminada somente pela luz da lua e pintou um ambiente de grande mistério e assombro na floresta amazônica que, na aurora do dia, os índios viram surgir uma atmosfera densa e um escuro nevoeiro que tomou toda a aldeia.

Esse imenso vapor sombrio assustou a todos os índios que, com medo de sua presença, se esconderam em suas ocas enquanto o cacique realizava dentro da sua oca um feitiço para espantar aquela névoa sombria e melancólica da aldeia, mas seus esforços foram inúteis e, durante uma semana inteira aquela sombra nebulosa pairou sobre a aldeia, deixando toda a tribo apavorada e obrigando-os a ficarem dentro de suas ocas por medo do que poderia lhes acontecer se saíssem naquela névoa densa e obscura.

No entanto, depois de uma semana a névoa escura saiu da aldeia e se desfez no ar, deixando, em fim, os raios de sol penetrar. Todos os índios saíram de suas ocas para na aldeia festejar, mas quando a noite caiu e se ouviu novamente o canto da Mãe-da-Lua a seus gritos de dor apavorar, todos  os índios da aldeia imediatamente começaram a se sentir mal e passaram a noite toda a vomitar.

Durante a madrugada, sob o canto agoniante da Mãe-da-Lua, todos os índios muito fracos começaram a chorar, sentiam seus corpos doloridos e quentes e viram a febre o seus corpos tomar. Desidratados de tanto vomitar, todos os índios aos poucos começaram a cair ao chão com falta de ar, e dentro de alguns minutos toda a aldeia viu a Mãe-da-Peste junto com Luison, o deus da morte, chegar.

Labatut

Bicho Cabeludo - Labatut

Na fronteira do Ceará com o Rio Grande do Norte, especificamente no chapadão do Apodi, uma casa estava com um dos quartos com a luz acesa durante a madrugada, era um garotinho de férias que estava a jogar videogame escondido dos pais; a TV estava a uma altura baixa, mas não tão baixa que não pudesse ouvir o som do jogo. Às três da madrugada, o cachorro da família que estava dormir no terreiro em sua casinha, começou a latir desesperadamente como se alguém tivesse invadindo a casa, mas os pais do garotinho não acordaram, pois tinham o sono muito pesado.

Mesmo sob o som do latido do cachorro, o garoto ouviu também passadas grandes como um trote estugado se aproximando de sua casa e, com medo e muito assustado, deixou o videogame de lado e foi até a janela que estava aberta para ver o que estava acontecendo e, não conseguindo ver nada por causa da escuridão, fechou a janela e saiu na ponta dos pés para não acordar seus pais e foi até a porta da sua casa; acendeu a luz da varanda e abriu a porta bem calmamente para que o seu rangido não despertasse seus pais, então saiu até a varanda de sua casa e, sob a escuridão da noite iluminada somente por uma lua minguante, viu surgir de repente da escuridão um bicho de pés redondos, mãos compridas, os cabelos longos e assanhados, corpo cabeludo como um porco-espinho, com um único olho grande no meio da testa e dentes como presas de elefante. Apavorado, o garoto soltou um enorme grito que imediatamente acordou seus pais, mas antes que eles pudesse sair da cama, o bicho pegou o garoto, colocou-o debaixo do braço e, assim que o pai do garoto chegou até a porta de casa armado com uma espingarda, viu ao longe o seu filho ser levado por aquele bicho que, num andar ligeiro, sumiu na escuridão da noite mas, quando olhou sobre uma pedreira em frente a sua casa, viu sob a claridade da lua minguante, aquele monstro com seu filho nas mãos e, levantando-o para o alto, viu-o ser devorado vivo pelo bicho.

O pai do garoto caiu de joelhos chorando enquanto sua mulher via tudo da janela do quarto e, assim que o bicho devorou o garoto, ambos viram-no dar um grande salto e pairar sobre a lua. Era o Labatut, um bicho pior do que o lobisomem, que mora, segundo dizem os antigos, no fim do mundo, e todas as noites percorre as cidades para saciar sua fome, e ataca as casas em que se depara com as suas luzes acesas ou ouve algum barulho. Os pais do garoto não entenderam como Labatut poderia ter levado seu filho se ele estava a dormir tranquilamente em seu quarto, mas quando foram até o quarto do garoto, viram o videogame ligado e ouviram o som da TV, e então compreenderam por que Labatut havia levado seu filho e o devorado vivo.